segunda-feira, 25 de julho de 2011

"Não Rolou?"

Finalmente. Hoje é o dia. Melhor dizendo, a noite. Acordei ao amanhecer sozinha, o coração já batendo mais forte. Parece piegas, mas sempre me sinto assim. Como se fosse a primeira vez.

Mas até chegar a hora tão aguardada, o dia é exatamente como qualquer outro. Só que pior; eu sei que o tempo precisa passar rápido. Infelizmente, todos temos obrigações. Não que meu dia seja ocupadíssimo, mas é difícil manter a concentração em qualquer outra coisa. Fico pensando, pensando... “e se dessa vez não rolar como da última? O que pode dar errado?”
Enfim, vocês sabem como é. Aquela típica tortura psicológica auto-infligida, que precede qualquer momento verdadeiramente significativo.

Obviamente, as horas passam arrastadas. Em qualquer outra ocasião, já seria um novo dia. Mas não hoje. Percebo que todos evitam falar comigo mais que o necessário. Sabem que meu humor não é dos melhores. Irrita-me que eles me conheçam tão bem. Dá vontade de gritar com elas por não terem me dado a oportunidade de gritar com eles. Finalmente o dia passa e eu posso sair daqui.

A próxima fase também não me agrada. Aparência é essencial. Principalmente quando dizem que não é. Por sorte, escolho minhas roupas rapidamente. Talvez rápido demais. "E se eu me esqueci de algo? As cores estão certas? O vestido não é curto demais? E aquele outro não seria longo demais?"
As perguntas se multiplicam enquanto encaro uma mulher cada vez menos confiante no espelho. Por fim, encontro a combinação perfeita.

Mas ela me custou quinze minutos de atraso. Olho ao meu redor, ninguém parece estar entediado. Ótimo. O salão como sempre está lindo. Sento-me e logo depois ele chega. Impressionante como todos aparecem com a mesma expressão no rosto. Até hoje não consigo identificar qual o sentimento que aquele semblante tão familiar esconde...
Estão todos olhando para mim. Acho que me calei por muito tempo. Chegou a hora. Meu coração quer explodir. Tento falar, mas nenhum som sai da minha boca. Na terceira tentativa minha voz consegue sair, talvez um pouco alta demais.

“Cortem-lhe a cabeça!”

Arregalo os olhos enquanto a lâmina desce. Segundos depois, todos deixam escapar um murmúrio de espanto. Quase que instantaneamente perco o controle. Está tudo arruinado.

A cabeça não rolou? Como não rolou? Construímos até uma rampa para que isso jamais acontecesse! Ela era grande demais? Pesada demais? Talvez quadrada demais. De todas as coisas que podiam dar errado... essa é a pior delas! A pior!

Estão todos estáticos, esperando o que vai acontecer. Nem eu sei ao certo. Antes que eu possa pensar, algo ainda mais inesperado tira novas interjeições de espanto da boca dos convidados. Em um ato de desespero, o carrasco acertara um chute muito do bem dado na cabeça. Ela subiu alguns metros, voou por alguns segundos e finalmente se encaçapou dentro de uma cesta de maçãs em cima da mesa do banquete.

Um silêncio mortal cortou o salão. Logo depois, veio o riso. Generalizado, incontrolável. Durou vários minutos.
Nascia assim uma nova tradição.

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