quinta-feira, 5 de julho de 2012

Portas


Florence finalmente chegava a seu mais novo destino. Uma comprida, porém simples cabana de madeira. Ali dentro, disseram, ela poderia encontrar muitas verdades que procurava. Talvez, descobriria até como voltar para casa.

Contudo, havia algo de estranho naquela cabana. Duas portas, idênticas, uma ao lado da outra. Em cima das portas, entalhado na madeira, lia-se “ESCOLHA”, em letras garrafais.

Florence caminhou em direção à porta da esquerda. Contudo, hesitou ao girar a maçaneta. Como saber qual era a certa? E o que aconteceria se entrasse na porta errada? Florence estava ali tempo suficiente para saber que escolhas erradas costumavam sair caro nesse mundo. Voltou e sentou-se em frente à cabana. Apoiou a cabeça em suas mãos enquanto encarava as portas.

Não demorou muito e um saltitante coelho passou por Florence. Ele nem olhou para Florence, para a palavra ou para as portas. Abriu logo a porta da direita e pulou para dentro. Florence sorriu, aquele coelho sabia das coisas. Correu até a porta da direita e entrou.

Florence não podia acreditar em seus olhos. À sua frente, outra cabana. Ou seria a mesma? A mesma palavra entalhada de forma idêntica. Só que dessa vez, haviam três portas ao invés de duas. E o coelho havia inexplicavelmente desaparecido. Florence logo percebeu que dessa vez, ninguém apareceria desta vez para ajudar. Escolheu novamente a direita.

Florence já sabia o que iria ver. A mesma cabana, quatro portas. Iria escolher a direita toda vez. Afinal, algo semelhante funcionava com labirintos e seria fácil de voltar caso sua estratégia não funcionasse.

E assim foi. Porta após porta, Florence seguia em frente. A cada porta que abria e voltava a ver a cabana, sua confiança diminuía, embora ela não demonstrasse. Quando ela chegou a doze portas, Florence perdeu a coragem de continuar. Aquilo estava se tornando cada vez mais complicado e não havia nada ali indicando que ela estava fazendo a escolha certa. Era hora de voltar.

Florence abriu a porta por onde veio, mas não estava preparada para o que viu, embora não fosse tão surpreendente assim. A mesma cabana, treze portas. Florence sentou-se no chão e começou a chorar. Aquilo não era um labirinto e ela ficaria presa ali para sempre. 

“Não chore.” – uma voz inumana disse em meio às lágrimas de Florence. Ela olhou em volta, assustada. Não havia ninguém ali.

“Aqui embaixo.” – Florence olhou para baixo. E viu o que parecia ser sua própria sombra materializar-se em sua frente. Uma forma negra levantava-se fluidamente do chão, vazando para os lados. Quando finalmente terminou, não se parecia nada com Florence. Dois olhos amarelos brilhantes abriram-se. Apesar de ser um tanto bizarra, Florence não teve medo. Podia sentir que sua sombra queria apenas ajudar.

“Eu estou perdida aqui. Nós estamos.” – Florence agora continha suas lágrimas. “E eu não sei como sair.”

“Claro que você sabe.”

“Eu sei?” – Florence agora estava perdida.

“Sim. Se eu sei, você também sabe.” – o rosto da sombra se movia. Florence achou que era uma tentativa de sorriso.

“Se você sabe, então me fala logo! Qual é a porta?”

A sombra riu. “Qual porta? Pelo jeito, vamos ficar aqui por mais um tempo…”

Florence agora sentia-se irritada e, honestamente, um tanto quanto ofendida por sua própria sombra. “Se você vai ficar rindo aí e não vai me ajudar, por que veio?”

“Vir? Eu sempre estive aqui!”

“Claro, mas não desse… jeito.”

“Eu só tenho um jeito. Florence, pense…” - Ela bem que estava tentando, porém sem muito sucesso. A sombra aproximava-se lentamente. “Se eu tenho a resposta, você também tem. Nós somos a mesma coisa.”

Florence suspirou e olhou para baixo. Quando viu sua sombra ainda no chão, intacta, Florence entendeu o que estava acontecendo. Caminhou em direção à forma negra e a abraçou. Imediatamente, ela sentiu uma conexão que nunca havia sentido antes. Havia se conectado consigo mesma pela primeira vez em muito tempo, talvez pela primeira vez na vida.

Agora ela possuía a resposta enquanto a forma negra dissolvia-se no chão. “As portas nunca tiveram nada a ver com isso, não é mesmo? Obrigada.” – Florence sorria e, em segundos, estava sozinha novamente.

Florence andou em direção a uma porta, confiante. Não importa qual delas. Abriu a porta e entrou. Finalmente, estava dentro da cabana e desse dia em diante, entendia que não importava a circunstância, ela estaria sempre no lugar certo e na hora certa, uma vez que era ali onde ela estava agora e nada mais importava.

Florence finalmente encontrara a verdade que procurava. O que havia dentro da cabana é uma outra história.